terça-feira, 10 de dezembro de 2013

UM VISLUMBRE DA TEOLOGIA BÍBLICA DO TRABALHO


Esboço da mensagem pregada pelo autor na Igreja Presbiteriana da Alvorada (SHC/N SQ 410 Área Especial s/nº - Brasília/DF), por ocasião da “Semana com Propósitos”, realizada no período de 8 a 14 de dezembro de 2013. A proposta desta semana é promover a análise de como nossos propósitos devem ser firmados para a glória de Deus em quaisquer aspectos da vida, tais como: vida pessoal, vida familiar, vida espiritual, vida profissional, vida ministerial, vida financeira e os relacionamentos.

“Consagre ao Senhor tudo o que você faz, e os seus planos serão bem-sucedidos.”
Provérbios 16:3

Não nos é suficiente identificar propósitos. Devemos consagrá-los ao Senhor! Devo, inicialmente, destacar a existência de uma perigosa dicotomia: O sagrado e o Secular. Qual a consequência, ainda que sutil, que este tipo de pensamento pode ocasionar?

1.  Isso pode nos conduzir a compreender a vida espiritual como sendo unicamente possível de ser vivida no ambiente de uma comunidade espiritual;
2.  Isso pode nos conduzir a compreender que os demais aspectos de nossa vida (familiar, profissional, emocional, etc.) podem ser vividos sem qualquer submissão às verdades da Escritura.

Entretanto, o fim desta dicotomia está explícito nas Escrituras; senão, vejamos:

“Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus.”
I Coríntios 10:31

“E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai.”
Colossenses 3:17

A vida espiritual deve permear todos os aspectos de nossa vida, devendo ser compreendida como sendo “nossa vida”, e não como sendo “um dos aspectos” de nossa vida. Muitos cristãos tendem a fazer uma separação entre vida secular e vida espiritual. Como vimos, a Escritura declara o fim desta dicotomia. Quais as implicações se eliminarmos esta dicotomia?

1.   Tudo o que exercemos na vida terá um valor sublime, pois passará a estar integrado com a vida espiritual, tendo, por conseguinte, o propósito de glorificar a Deus;
2.  Tudo o que era visto na perspectiva do comum passará a ser visto na perspectiva do sagrado;
3.  Todo trabalhador passará a ser visto como um mordomo que serve a Deus.
Já abordamos que a nossa vida espiritual não deve ser vista como um apêndice de nossa vida. A partir do momento que nos rendemos ao senhorio de Cristo, temos uma “nova vida”, cujo desenvolvimento está sujeito às leis que regem o Reino de Deus.

Minha tarefa nesta ocasião é apresentar-vos, ainda que de forma inicial, um pequeno vislumbre da vida profissional sob o enfoque bíblico, de modo que possamos glorificar a Deus. O cristão precisa ter a consciência de que o seu trabalho não pode estar dominado pelos seguintes males: vício de trabalhar, trabalho escravizador, primazia da competitividade, culto do sucesso, materialismo, e culto da pessoa autorrealizada.

Assim sendo, quero abordar apenas dois aspectos do que poderíamos chamar de “A Teologia Bíblica do Trabalho”, de modo que lhes apresentarei apenas um vislumbre deste tema tão amplo e maravilhoso:

I – O trabalho não é uma consequência da queda do homem.
II – O trabalho é uma oportunidade para o despertamento da generosidade.

I – O TRABALHO NÃO É UMA CONSEQUÊNCIA DA QUEDA DO HOMEM.

Inicialmente, a narrativa da criação é uma narrativa do trabalho divino. Alguns verbos descrevem este trabalho: criou (Gn 1:1), pairava (Gn 1:2), disse (Gn 1:3), viu (Gn 1:4), chamou (Gn 1:5), colocou (Gn 1:17), façamos (Gn 1:26) e abençoou (Gn 1:28). Um pouco mais adiante, a narrativa da criação converte-se numa narrativa do trabalho humano; senão, vejamos:

“Tomou, pois, o Senhor Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar.”
Gênesis 2:15

O verbo “cultivar” relaciona-se com a cooperação humana na produção da vida, ao passo que o verbo “guardar”, relaciona-se com a cooperação humana na preservação da vida. Esta era a perspectiva inicial de Deus com relação ao trabalho, ou seja, uma atividade voltada para o cultivo e a preservação da vida.

II – O TRABALHO É UMA OPORTUNIDADE PARA O DESPERTAMENTO DA GENEROSIDADE.

O trabalho deve ser compreendido como uma atividade que se destina a criar oportunidade para a generosidade. Caso venhamos a trabalhar pautados na inclinação de nossa natureza caída, o egoísmo característico desta natureza caída, nos conduzirá a trabalharmos com os olhos fixos no “eu”, de modo a fazer com que valorizemos o que temos e o que conquistamos pelo trabalho.
A Escritura, por outro lado, desconectando-nos do egoísmo, evidencia que um dos objetivos que Deus intenta alcançar em nossa vida por intermédio do trabalho é que sejamos generosos.

“Aquele que furtava não furte mais; antes, trabalhe, fazendo com as próprias mãos o que é bom, para que tenha com que acudir ao necessitado.”
Efésios 4:28

“Ora, aquele que dá semente ao que semeia e pão para alimento também suprirá e aumentará a vossa sementeira e multiplicará os frutos da vossa justiça, enriquecendo-vos, em tudo, para toda generosidade, a qual faz que, por nosso intermédio, sejam tributadas graças a Deus.”
II Coríntios 9:10-11

“Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus Mais bem-aventurado é dar que receber.”
Atos 20:35

A generosidade tratará com a nossa inclinação egoísta, de modo que aquilo que conquistamos e adquirimos pelo trabalho seja visto como um recurso disponível para a prática da generosidade, desconectando-nos do “eu” e promovendo nossa conexão com o outro.


Que o Espírito de Deus nos auxilie na compreensão destas duas importantes vertentes da Teologia Bíblica do Trabalho. O trabalho não é uma consequência da queda do homem, mas antes, uma atividade voltada para o cultivo e a preservação da vida, um ato de cooperação com Deus na condução dos rumos desta vida. Além disso, o trabalho é uma atividade voltada para o despertamento da generosidade em nosso viver, de modo que possamos militar contra a velha natureza que nos impõe uma vida egoísta.